Nunca acreditei nesse papo de que
ter uma moto (ou outro veículo automotor qualquer) fosse a mesma coisa que
criar um filho. Até o dia que comprei minha moto e concluí que é verdade
mesmo... pelo menos financeiramente e na questão de cuidados, que tornam-se
mais acentuados e frequentes do que os que eu sempre dispensei para minha
bicicleta, que continua minha fiel companheira na cidade.
Mas o fato que quero narrar se
deu justamente quando, após um dia inteiro procurando pela cidade (de
bicicleta), achei uma determinada peça para moto num ferro velho. Era final de
tarde, mas durante o dia todo houve uma recusa em amanhecer. Não me lembro de
ter presenciado dias tão cinzentos em Campo Mourão, mas sim, apenas na minha
saudosa e soturna Guarapuava. Com a noite se aproximando e feliz por ter
encontrado a peça, voltei para a pensão pela rua da Paróquia Nossa Senhora
Aparecida, na vila Urupês. Faltando algumas quadras para meu destino, me
deparei com uma destas pequenas cenas de cotidiano que tornam meus dias simples
mais felizes. Era noite de feira livre.
A cada dia da semana a feira
ocorre em determinado bairro de Campo Mourão. Logo que me mudei para cá e ainda
morava no Montes Claros, lembro-me que era quase um hábito sagrado visitar a
feira as sextas, vendo a movimentação na praça e enchendo a barriga de pastel,
bolo e caldo de cana. Entretanto, quando mudei para o centro, esse hábito se
perdeu nas cinzas, substituído naturalmente pelos hábitos de uma nova rotina.
Mas eis que, naquela terça
monocromática e fria, lá estava a feira livre. Me recepcionando. Não resisti.
Desmontei da bike e novamente fascinado, olhei as barraquinhas com frutas,
legumes e toda a sorte de lanches e quitutes. Melhor que isso era observar como
as pessoas percorriam o local numa paz que não estou acostumado na cidade...
Apesar de pequena, Campo Mourão não é o perfil de uma cidade pacata. Quem
duvida disso, pergunte para algum policial militar ou bombeiro. São muito
comuns as mortes por armas de fogo e armas de combustível, motor e rodas... Mas
ali, naquelas duas quadras com iluminação laranja, as pessoas conversavam
despreocupadas e o clima era de uma pequena vila. Durante meu trajeto, um
menino de aproximadamente seis anos olhou fascinado para minha bicicleta e
disse: “olha pai, uma bicicleta com luzes!”. Sorri para ele. E logo após comer
um pastel, daqueles que misteriosamente tem “gosto de feira”, o menino
novamente me abordou: “ei moço, essa caneta é sua?”, referindo-se a uma caneta
encontrada no chão, ali perto. O objeto não me pertencia, mas minha
identificação com a criança foi quase imediata. Educadamente, o menino se
retirou e voltou para a companhia do pai, que pelo discreto sorriso, parecia
orgulhoso de criar um rapaz educado já em tenra idade.
Quanto a mim, segui destino logo
após, com a noção de que criar um filho e manter uma moto são duas coisas bem
onerosas e ocupantes. Mas o prazer de se fazer isso é evidente. O da moto é
sentir o vento no rosto na imensidão da estrada em frente. E o do filho, vi
hoje, ao olhar o rosto daquele pai.
É por isso que eu gosto de feira.
Um comentário:
texto legal hein!! cuide bem de seu filho(virago)... é bom sair da rotina de vez em quando!!!
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