Quando criança, cultivei um
ambicioso sonho de ser aventureiro. Na verdade, não tinha exata noção do que
significava ser um aventureiro nos dias de hoje, apenas tinha a aspiração
inocente de ser como os heróis dos filmes, livros e quadrinhos que eu
avidamente devorava. E esse sonho se resumia basicamente em viajar,
conhecer muitas pessoas e lugares. A parte de ser justiceiro – e lutar contra
monstros – eu já sabia que não seria possível, mas enfim, era uma zona de
conforto me imaginar um jovem forte e independente, a despeito da minha real
situação, de um moleque magrelo e medroso.
À medida que os anos
transcorreram, fui quebrando o pequeno ovinho que me isolava. Os festivais de
artes e ciências que participei durante o Ensino Fundamental e Médio – que me
mantinham longe de casa por quase uma semana – eram o ápice das minhas
aventuranças, lembrando, é claro, que sempre fui atrasado nessas coisas.
Enquanto meus colegas já tinham barba e gogó, eu mal tinha uma penugem na cara.
Enquanto eles já iam em festas, viajavam constantemente e ganhavam sua
liberdade progressiva de adolescência, eu fui praticamente uma criança até os
17 anos (minha puberdade veio muito atrasada). E bem, enquanto as ficadas,
namoricos e afins rolavam soltas no colégio, eu era apenas um expectador, que
de vez em quando gamava em uma menina, mas mantinha essa paixão fugaz apenas no
meu pensamento e na minha caneta, pois meu complexo de inferioridade era tão forte e enraizado
que me impedia até mesmo de dizer bom dia para a referida garota.
E então, quando surgia uma
oportunidade dessas, de sair de minha casa, meu porto seguro, e viajar na
companhia de professores e colegas para os festivais, me sentia independente e
feliz como nunca era.
E hoje tenho o privilégio de
dizer que essa sensação de plenitude, esse sonho de criança de ser aventureiro,
cresceu e tomou forma. Consegui, depois de tantos anos, finalmente me convencer
que eu posso ser mais livre, independente e um tanto impetuoso. Tudo isso,
óbvio, de maneira tranquila e planejada.
Começou quando eu decidi viajar
de carona. Devido ao custo muito alto de viajar constantemente de ônibus, a
carona é uma boa alternativa para quem é estudante ou militar estadual. Durante
os dois anos onde esticar o dedo na beira da estrada era quase rotineiro, vi,
ouvi e vivi muitas coisas. Abençoadamente, nunca passei por apuros ou momentos
desagradáveis. Apenas viagens divertidas e algumas histórias pitorescas. O
hábito de pegar carona me tirou um pouco do medo terrível que eu tinha de tudo
e todos. Conheci pessoas das mais diversas classes, opiniões e temperamentos. E
isso me fez bem. Mas eu ainda nem imaginava o que me aguardava adiante.
Foi quando comprei minha Virago.
Desde aquele momento, adotei um estereótipo que sempre admirei: do Easy Rider,
o motociclista viajante e sem destino. Muito próximo do tipo de aventureiro que
eu sonhava quando criança.
Os primeiros dias foram tensos.
Meu conhecimento sobre manutenção de motos era praticamente nulo, além de minha
habilidade de piloto se resumir as aulas recém acabadas da auto-escola. Quando
fiz pouco mais de uma semana de compra, escorreguei numa curva e levei meu
primeiro tombo. A moto saiu quase intacta e eu só ralei braço e joelho. Tanto
que levantei e continuei viagem. O que mais machucou naquele dia foi o orgulho.
Mas serviu de lição e desde então não tive mais problemas, à medida que minha
habilidade e sincronia com a motoca aumentam a cada passeio. A parte de
manutenção foi da mesma forma. Aprendia um pouco mais sobre cuidados com a moto
quando os problemas apareciam nela. E não foram poucos: pneu furado, cabo de
velocímetro estourado, retentor de bengala vazando, mau contato no sistema
elétrico, chave de ignição capenga, ferrugem aqui e acolá. Cada um dos pequenos
problemas era resolvido e eu aprendia um pouco mais sobre a minha maquininha.
Quando, enfim, as mudanças
vieram. Mudei-me para São José dos Pinhais, e como já disse exaustivamente em
outros posts, fora do quartel, meu círculo social é quase nulo. E assim que fiz
minha mudança para cá, em meados de novembro, estabeleci que ocuparia minha
cabeça com coisas boas até chegar o esperado dia de minha transferência para
Guarapuava. Uma das medidas foi ler muitos livros. E a outra medida, aproveitar
as folgas e conhecer todos os lugares interessantes que eu conseguisse na
região da capital paranaense.
Comecei com o ônibus de turismo
de Curitiba, cujo custo-benefício, a meu ver, é justo e perfeito. Visitei
praticamente todos os cartões postais da cidade. Nos lugares que não tive tempo
de visitar durante o passeio no ônibus, regressei nas folgas posteriores, com
minha fiel Viraguinho. Esse foi o resumo de meu dezembro: os clássicos, Jardim
Botânico, Teatro Guaíra e Opera de Arame; Centro Histórico, onde conversei com
motociclistas de todas as tribos e facções, além de visitar uma feira livre
gigantesca, que me trouxe boas lembranças de Campo Mourão e a feira do Urupês;
teve mais o Bosque Alemão, Mirante da Oi, o Museu Oscar Niemeyer (eu não
imaginava que o tal olho fosse tão gigantesco), além de todos os parques,
bosques e exposições que eu descobria por aí. Quando esmiucei Curitiba o
suficiente, parti para as redondezas. Visitei a histórica cidade de Lapa –
capital brasileira da cultura em 2011 – fui para Vila Velha, com sua famosa
taça, além de conhecer o maior moinho da América Latina em Castrolanda, uma
próspera e acolhedora colônia holandesa. Por último, nessa semana que passou,
desci a Estrada da Graciosa e visitei o litoral paranaense, para sentir o salgado
gosto do mar depois de mais de dois anos...
Enfim, se parasse para escrever
sobre cada uma dessas visitas, preencheria muitos posts. No total, visitei mais
de 40 lugares, cada um registrado com uma média de três a seis fotos, todas
organizadinhas e catalogadas. Um dia, se tiver paciência, postarei as fotos –
aos poucos – de cada um desses lugares fabulosos.
E por fim, o melhor foi fazer
tudo isso sem gastar muito. O combustível é caro, mas a moto é econômica. Fiz
muito lanche em posto de gasolina, tomei chuva, pesquisei onde tinha pousadas
baratas e enchi minha mochila com muitas bugigangas (de lembrancinhas a livros).
Hoje, mais do nunca na minha curta vida, me sinto o aventureiro que sonhei
quando criança. Mesmo restrito a distâncias curtas, vejo em cada pequena visita
ou viagem, um prelúdio para metas cada vez mais além. E viagens cada vez mais
longas e distantes. Hoje é um pedacinho do Paraná. Amanhã pode ser o Brasil, e
quem sabe um dia, uma parte do mundo. Sei que posso tudo isso, se planejar com
disciplina e prudência, acrescida de um espírito recém adquirido de coragem;
uma coragem dentro de um limite saudável, que me faz cada dia mais feliz.
Um adulto que não quer que o
espírito de menino sonhador morra.
Um amigo de Narnia vivendo sua
própria Viagem do Peregrino da Alvorada...
Um comentário:
Irmão", admiro muito seu blog. É muito bom mesmo.
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