E eu, me confrontei novamente com
esses terrores num curto diálogo, que me martelou nesses últimos dias...
Os dois caminhões colidiram frontalmente
numa curva. Um destes ficou embrenhado no denso matagal na beira da pista,
dificultando o acesso a cabine, toda destruída. Com meu pequeno tamanho, me
esgueirei pela porta do passageiro e cheguei até o motorista, cuja parte da
cabine lhe dava pouquíssimo espaço para se mexer e sua perna fraturada
encontrava-se presa nas ferragens. Seu rosto estava vertendo sangue, mas ele
estava muito calmo. Era daqueles sujeitos criados à maneira antiga, do tipo que
trabalha muito e não reclama de nada. Com um lance de consciência assustador,
me perguntou sereno: “Bombeiro, seja sincero comigo, eu vou morrer?”. Fiquei
sem reação por alguns segundos. E então respondi que ficaria tudo bem. Pela
análise inicial, ele não tinha ferimentos que trouxessem riscos imediatos a sua
vida, mas foi uma resposta arriscada. Sempre é... Felizmente conseguimos retirá-lo
da cabine e o mesmo foi para o hospital. A última notícia que tive dele foi que
estava se recuperando.Quanto ao outro motorista, este fez a mesma pergunta, mas já consciente de que sua situação era muito mais grave. E após um resgate dramático e uma longa viagem até o hospital, seu corpo não resistiu e ele se juntou ao Oriente Eterno...
De vez em quando, prometer que “tudo
ficará bem” torna-se uma mentira. E é nesses dias que vejo o quão frágil é a
vida humana, tanto das vítimas quanto a minha. Mais de uma vez me confrontei
com a situação de atender pacientes em situação gravíssima, mas conscientes o
suficiente para fazerem essa pergunta fatal, ou ainda pior, me olharem nos
olhos e implorarem para que eu fizesse algo milagroso por eles, pois não
queriam morrer... Alguns sobreviveram, mas não todos...
E nessas situações, eu
chegava em casa transtornado por ter aplicado todo o protocolo de atendimento,
ter feito tudo o que podia, mas ter que contar mais uma vida indo embora no meu
turno de serviço. Mas assim funciona a vida na rampa. Nesse meio tempo de
folga, ou até mesmo na calmaria posterior de uma ocorrência, enquanto meus colegas e eu limpamos uma
ambulância banhada de sangue que não é nosso, o coração de cada bombeiro vai se
acalmando e criando mais um escudo. E é
desta maneira, que dia após dia, aprendo que aplicar bem a vida é também pensar
na morte. E dessa maneira, mais próximo me torno da pedra oculta.
V.I.T.R.I.O.L.
Um comentário:
É meu caro colega apreciador de burgman 400... o que importa e saber que demos o nosso melhor, demos o nosso máximo para ajudar a vítima... e dormir com a consciência limpa....abraço.... Waleski
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