Desde quarta-feira, durante mais
de 40 horas não parou de cair água do céu. O tempo já não era mais o cinza
depressivo que Guarapuava sempre esteve acostumada. Já beirava o opressivo.
Passam-se dois dias e as roupas não secam, as paredes transpiram, os livros
começam a eriçar as páginas por conta da umidade. E haja farda para tanto
barro.
Já escrevi em outros posts como
acho curioso o fato que em minha vida toda grande mudança (ou o oitavo estágio do monomito de Joseph Campbell) vem acompanhada de um tempo terrivelmente
carrancudo. E nessa semana, decisiva para o curso de socorristas que estou
finalmente concluindo, não foi diferente. Há cinco dias convivo com uma gripe
que se recusa a sarar, pois a cada dia tomei mais e mais chuva. E o teste
derradeiro foi na madrugada dessa sexta feira, quando o celular tocou perto das
4 da manhã. O quartel convocava todos os socorristas para se deslocarem a
Laranjeiras do Sul, por conta dos deslizamentos de terra que ocorreram na
cidade e resultou soterramento de duas pessoas. Fui para o quartel do jeito que
pude, e após uma hora de viagem com os companheiros de farda, chegamos ao
local. Um enorme galpão de produtos agrícolas teve metade de sua estrutura
arrasada por uma massa de terra e entulho. No meio da terra, o que um dia foi
uma casa. E onde um dia foi a casa, mãe e filha, ausentes de vida, escondidas
entre escombros e barro.
A busca foi trabalhosa, envolveu
um grande esforço conjunto de bombeiros, policiais e civis. Foi uma manhã de
barulho de trator, cheiro de sementes agrícolas, água enlameada e chuva. Chuva
insistente, que não parava nem por um segundo, e que começou a me dar raiva a
certa altura.
No fim da manhã, o último corpo
foi encontrado.
Um pai, que escapou incólume da tragédia,
amargou a perda da casa, da mulher e da filha...
Voltei para Guarapuava e, à noite,
assumi um turno na ambulância, para prevenção de um evento esportivo. Já era
quase meia noite quando a chuva parou. Ficou apenas o ar saturado de neblina. E
a lembrança que, depois de uma semana sombria, este já era o primeiro dia de
inverno.
Que a Árvore da Vida conforte todos aqueles que ficaram, por conta de todos aqueles que partiram...
Um comentário:
Acho mesmo que nos piores momentos, diante de situações das quais nos vemos totalmente impotentes, é que tiramos as grandes lições!
Lindo texto, guerreiro!
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